terça-feira, 17 de agosto de 2010

A política fiscal brasileira: limites e entraves ao crescimento

Francisco Luiz C. Lopreato
Introdução

O objetivo do texto é analisar a política fiscal brasileira recente e as restrições para levar adiante os projetos de investimentos e de infra-estrutura, sem comprometer a situação financeira do setor público. O modelo de política fiscal centrado na geração de superávits primários e na expansão da carga tributária chegou ao limite e precisa ser repensado. O debate das usuais teses
de corte dos gastos e de desvinculação de receitas não é suficiente. É preciso rever o espaço da política fiscal, as suas relações com as políticas monetária e cambial, enfrentar os problemas tributários, as relações federativas, bem como controlar os gastos públicos e a dívida. Porém, a análise dessas questões ganham sentido se a agenda fiscal não ficar restrita à política de estabilização e voltar a ser vista como instrumento na estratégia de crescimento.

O texto relembra a construção do novo regime fiscal a partir da implantação do Plano Real realçando o caráter do papel do Estado ou, mais particularmente, da política fiscal na estratégia recente de desenvolvimento. O antigo ideal de construir as bases de atuação e de colocar o Estado como indutor do projeto de desenvolvimento foi abandonado e a política fiscal
passou a ser vista como âncora das expectativas dos agentes econômicos, avalista do processo de valorização do capital privado e responsável pela sustentabilidade da dívida.

A credibilidade da política fiscal ganhou ares de ferramenta imprescindível na formação das expectativas dos agentes, na avaliação do risco-país e no comportamento dos juros e do câmbio. Em razão disso, o esforço de reconstrução da institucionalidade fiscal nos 90 buscou assegurar a
sustentabilidade intertemporal das contas públicas e não devolver ao Estado o papel ativo de indutor do desenvolvimento. Não se trata aqui de recolocar o velho ideal do desenvolvimentismo, mas de reconhecer que a presença do setor público ainda é necessária, sobretudo, no espaço de uma economia atrelada aos humores do ciclo de liquidez internacional.

A atual perspectiva de atuação da política fiscal desmontou os antigos de sustentação e construiu novo modus operandis, baseado na geração de superávits primários, na definição de regras fiscais e no trato das finanças dos governos subnacionais fundamentadas no ideal de hard budget constrain.1

O desenho da política fiscal preocupou-se em apontar o caminho a ser percorrido caso o risco-país e a volatilidade do câmbio e dos juros ameacem a situação prospectiva das contas públicas. As privatizações e o aumento da carga tributária atenuaram as possíveis tensões e viabilizaram a expansão simultânea dos gastos correntes e dos superávits primários, às custas, no entanto, do
constrangimento dos investimentos.

A política fiscal, presa à continuidade desse arranjo, viu o seu alcance limitado e os gargalos à ação do setor público se cristalizaram. O impasse no plano federal é notório. Os elevados superávits primários, as crescentes vinculações das receitas e o aumento dos gastos sociais restringiram os graus de liberdade da gestão das contas públicas, deixando o montante dos investimentos refém da conjugação favorável de arrecadação e de queda da taxa de juros. Por outro lado, o esvaziamento do poder de atuação dos governos estaduais, os grandes perdedores na evolução recente da federação brasileira, tornou-se visível. A renegociação das dívidas estaduais retirou espaço de manobra dos governadores e tornou difícil conciliar o serviço da
dívida e maior volume de investimentos.

Além disso, as articulações entre as esferas de governo, presentes no modelo anterior, deixaram de existir e nada foi colocado no lugar, com as exceções notórias do SUS e do Fundef, deixando um enorme vazio, que as propostas de PPPs não parecem ter potencial para ocupar.

A questão com a qual o governo se defronta atualmente é saber como superar as barreiras à ação do setor público e apoiar a retomada do crescimento, sem colocar em risco a estabilidade das contas públicas. Os analistas concordam em relação a esse ponto, mas não se deduz daí que haja
um entendimento comum sobre propostas concretas de como encaminhar o problema. A visão convencional vê as medidas de cortes dos gastos e de desvinculações das receitas como imprescindíveis na definição dos novos rumos da política fiscal, por ampliarem os espaços de manipulação dos gastos e permitirem a queda acelerada da dívida pública. Esta visão pautou grande parte das discussões recentes, mas as mudanças não avançaram. Os analistas contrários aos cortes na área social e os críticos da política macroeconômica defendem o debate em torno de uma agenda fiscal mais ampla que não tenha o foco analítico centrado na política de cortes, ao lado da revisão do arranjo macroeconômico e da construção de políticas a favor do crescimento, como
caminho para se obter ganhos na situação fiscal.

O objetivo do texto é contribuir no sentido de apontar os entraves da política fiscal e as dificuldades do setor público de contribuir na retomada do crescimento.

(1) Ver, entre outros, Rodden; Eskland; Litvack (2002) sobre a discussão teórica dessa questão e a análise do caso brasileiro em Vargas (2006).
Para ler o restante do artigo acesse o link: http://www.fclar.unesp.br/poseco/Politica_Fiscal_Desenvolvimento.pdf ou clique no título dessa postagem.

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